Tirar a medida como deve ser

31 Maio 2014 at 14:55 (Diy) (, , , , )

Há já algum tempo que andava a ver o que há por aí de SoC baseado em ARM. Depois de alguma investigação encontrei o PSoC4, que foi até agora a plataforma que mais me seduziu, pelas suas características técnicas, de ambiente de desenvolvimento e licenças (aconselho-vos a dar uma olhadela, só pelo gratuíto ambiente de desenvolvimento já vale a pena, é quase um game changer).

Para experimentar as potencialidades da plataforma decidi fazer um gerador de onda triangular, na placa de prototipagem que a Cypress vende por uma bagatela:

psoc4-pkit

Esta placa tem uma interface USB <-> UART e o que é basicamente uma breakout board para uma das variantes do PSoC 4. A placa pode partir-se em 2 ficando o conversor USB<->UART separada da breakout board.

Bom, mas isto do PSoC 4 é outro assunto que merecia só por si um outro (e grande) post. Para a questão que aqui me trás hoje, é continuar a ler o artigo…

Voltando ao gerador de onda triangular, acontece que percebi que quando no PC ligava um terminal série à placa (o meu gerador de onda triangular é controlado por porta série), começava a ter umas interferências na onda, vistas assim no osciloscópio:

Interferências no sinal

Aquelas cerca de 4 interferências em cada “encosta” da onda não era suposto lá estarem, e não estavam, desde o reset da placa até eu ligar o terminal série. Há uma outra interferência em baixo ao centro, maior, que capturei nesta imagem só para vos mostrar o que faz um ferro de soldar de 230V de temperatura regulável.

Pensei que talvez fosse um ground loop ou ruído de modo comum através do portátil mas desligando o portátil da corrente não faz qualquer efeito. Durante algum tempo ainda pensei que fosse o conversor USB<->UART que estivesse a enfiar aquele lixo no PSoC através da alimentação (de origem a placa é alimentada por USB através do conversor), mas passando a alimentação para uma fonte linear de laboratório isolada também não resolvia o problema. Depois pensei que talvez o ruído estivesse a ir pela linha de TX do conversor para a placa. Então um dia sentei-me e comecei a olhar a mais a sério para a questão, medindo as linhas que passam do conversor para a placa, não vendo lá nenhuma interferência. Até que me lembrei de tirar a medida como deve ser...

Normalmente tiro as medidas com o osciloscópio de uma forma “descuidada”, apesar de saber que em algumas situações não é de todo a forma de o fazer. E tirar a medida de forma descuidada é tão simples como fazer assim:

Tirar medidas à preguiçoso :)

Usando a garra de ground agarrada num qualquer ponto de ground e a ponta no sinal que se quer medir. Neste caso “apanho” o sinal num fio enfiado na matriz de contactos, onde faz contacto com um pino da placa de prototipagem que por sua vez vai dar a um pino do chip PSoC 4 ao centro da placa. Mas como é que a medição devia ser feita? Neste caso pelos vistos devia ser feita assim:

Medida como deve ser

Aqui a particularidade é que livrei-me da garra de ground e liguei o ground do circuito ao da ponta de forma muito curta (idealmente, o mais curta possível), encostando directamente a “malha” ground da ponta de prova ao pino de GND. Medido desta forma, até as interferências do ferro de soldar desapareceram:

Medida da realidade

É sabido que os fios de ground das pontas de prova dos osciloscópios agem como antenas e que introduzem no caminho da medição uma inductância que tem impacto na medição. Daí que a forma correcta de tirar uma medida minimizando interferências externas é encurtar ao máximo as ligações entre ponta de prova e circuito a medir.

Fica ainda outra foto de uma medida bem tirada, desta vez num outro projecto, onde estou a medir a tensão dreno-fonte de um MOSFET que comuta bastante depressa (~300ns):

Minimizar componentes parasitas na medição

Reparem na “mola” acopolada no contacto de ground da ponta de prova, o ground clip. É um acessório que costuma vir com todas as pontas de prova de osciloscópio e que serve exactamente para permitir tirar medidas “de muito perto”, com um fio de ground muito curto. Às vezes quando o local é difícil, são precisas artimanhas para fazer os contactos 🙂

Há uma outra coisa curiosa que detectei nesta investigação e de que nunca tinha ouvido falar (o que também não é assim tão estranho, eu não tenho formação em electrónica). Só o facto de ter a 2ª ponta do osciloscópio ligada ao osciloscópio, mesmo com o 2º canal desligado, é suficiente para “injectar” algum ruído no 1º canal. Descobri 2 formas de resolver isto; a 1ª e óbvia é desligar a ponta do osciloscópio, a 2ª é ligar o fio de ground da ponta não usada ao fio de ground da ponta usada. Já tinha percebido que em medições com os 2 canais é preciso ligar ambos os grounds das pontas de prova ao ground do circuito (no mesmo ponto), mas nunca me tinha apercebido que uma ponta não usada, só por estar ligada ao osciloscópio, já podia interferir num canal a ser usado – provavelmente porque age como uma antena.

A conclusão é que as interferências nunca lá estiveram. Portanto já sabem, em caso de dúvida, tirem a medida como deve ser 🙂

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